sábado, 20 de fevereiro de 2010

Sem Você

Nem na terapia conversei sobre como perdi a virgindade e agora me sinto no confessionário do purgatório, tendo que contar tudo num blog - acordo de ordinárias! Bem, serei breve, desabafando essa história que não comento (nem comigo mesma pra não deprimir). Ai, lá vou eu!
Conheci Arnaldo muito antes de imaginar-me casada com ele. Tinha cabelos de surfista, bochechas rosadas de sol e olhos verdes como o mar. Não me apaixonei ali, só tinha olhos para meu primo, amor platônico total.
Reencontrei Arnaldo e meu primo, anos depois, na avenida em pleno carnaval, e não associei aquele homem imenso, de costas largas e olhar esquivo com o surfista com cheiro de parafina. Meu primo desapareceu ao seu lado. Ali a gente se conheceu, se beijou, contei quatro palmos de costas, me pendurei em seu pescoço, me senti segura como nunca e começamos um namoro ansioso.
Não sou boa em guardar datas, então, alguns poucos meses depois, após um dia de praia, fomos para o apartamento vazio de um amigo dele e transamos no chão da sala. Se me lembro da sensação? Não sei bem... Fiquei procurando o sangue e não achava, comecei a me preocupar porque não usamos camisinha e veio a paranóia que podia estar grávida e meu mundo ruiria a partir dali, junto com minha virgindade.
Tensa como sempre fui, marquei, na mesma semana, uma consulta no ginecologista. Entrei, sem saber direito o que falar; lancei o discurso que considerava correto para o momento: estou iniciando minha vida sexual e gostaria de saber como prevenir DSTs e gravidez indesejada; também quero receita de um bom anticoncepcional – isso foi o máximo que consegui racionalizar. Ela pediu que vestisse aquelas roupas de exame, me deitasse na maca, veio com aquele objeto de filme de terror e... sangue pra todo lado.
Não tem nada de romântico perder o hímen num consultório ginecológico. Acho que por isso sempre tive a sensação de que fui violentada naquele dia, lembrando da dor, da indignação e da vergonha que senti em contar essa história pra quem quer que fosse. Sem glamour, nem brilho nos olhos como vejo nos filmes, deixei o símbolo da virgindade no lençol descartável do consultório da médica insensível.
Bem, casei com Arnaldo, meu grande cúmplice. Só eu e ele sabemos o quanto essa história determinou a nossa. Por isso também doeu muito me separar dele. Nos olhos dele é que me vejo melhor, até hoje, e escolhi a música de Antunes que diz como é esse sentimento que não nos permite viver juntos, mas ainda amá-lo como o guardião de minha alma:

Pra onde eu vou agora livre mais sem você
Pra onde ir o que fazer como eu vou viver
Eu gosto de ficar só, mas gosto mais de você
Eu gosto da luz do sol, mas choro sempre agora sem você, sem você, sem você, sem você
Às vezes acredito em mim, mas às vezes não
Às vezes tiro o meu destino da minha mão
Talvez eu corte o cabelo, talvez eu fique feliz, talvez eu perca a cabeça
Talvez esqueça e cresça sem você, sem você, sem você, sem você
Talvez precise de colchão, talvez baste o chão
Talvez no vigésimo andar, talvez no porão
Talvez eu mate o que fui, talvez imite o que sou
Talvez eu tema o que vem, talvez te ame ainda sem você, sem você, sem você, sem você

Um comentário:

  1. Ai, que música linda, que história linda...algo extraordinário, mesmo!
    Mas não precisa de terapia para entender que perder a virgindade é algo simbólico, e não material. A médica foi uma lástima, mas aí está vc, extraordinariamente mais mulher e consciente de suas possibilidades. Terapia, na escrita! Viva!!

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